O Globo
17/07/2014
Moradores de alguns bairros das zonas Norte e Oeste do Rio estão passando um sufoco para conseguir receber encomendas via Correios. A empresa não transporta os produtos até a casa dos clientes, como prevê o serviço, alegando serem “áreas de risco”. Com isso, os consumidores são obrigados a ir a um galpão na Avenida Brasil, em Campo Grande, para buscá-los. A recepcionista Thaís Borges, de 28 anos, discorda do argumento da estatal.
— Moro em Magalhães Bastos, numa região onde a gente não ouve falar em assaltos. É próximo à comunidade do Fumacê, pacificada — afirma Thaís, que comprou um tablet para a filha, pela internet.
Um carteiro, que atua no depósito e não quis se identificar, contou que a medida é para a segurança dos trabalhadores:
— É uma área de muito risco. Na região de Realengo, Guadalupe, Anchieta e Bangu, são, em média, de quatro a cinco assaltos por dia.
Em nota, o Correios afirmou que, “por medida de segurança e estratégia operacional”, não revela as ruas e os bairros onde o serviço de entrega está temporariamente suspenso. Pela mesma razão, a empresa não divulga dados sobre assaltos. Além do Sedex (cujo slogam é “Mandou, chegou”), o PAC (Encomenda econômica) também não é entregue em alguns pontos do Rio, somente correspondências e contas. A Polícia Federal não forneceu as estatísticas de roubos de cargas nos últimos seis meses.
A professora Kelli Cristina Santos, de 39 anos, teve que pagar táxi para ir ao galpão:
— Moro em Bangu e trabalho com artesanato. É a segunda vez que venho aqui, este mês. Gastei R$ 30 de táxi.
Para Marco Antônio da Costa, professor de Direito do Consumidor da Faculdade Mackenzie Rio, o serviço deve ser igual para todo cliente:
— Ele (Correios) não pode ofertar o serviço e depois dizer que não vai atender.
Renata Mansur, professora de Direito do Consumidor da universidade Estácio de Sá, explica que a medida gera prejuízo ao consumidor:
— Nesse caso,o que vale é o princípio da informação. O Correio deve informar ao consumidor. Não importa o motivo. E ele tem como informar pelo CEP. Se o consumidor não é informado antes, ele tem direito a danos materiais, que vai corresponder ao dinheiro que ele teve que despender para se deslocar e retirar a encomenda.
Maria Inês Dolci, presidente da Proteste Associação de Consumidores, também destaca a necessidade da informação para o consumidor antecipadamente:
— Eles não podem, no meio do caminho, mudar a regra do jogo. O consumidor precisa saber antes para que ele possa decidir se vai querer o serviço.
Procurado, o Procon-RJ informou, por nota, que “ressalvado o direito do Correios de não atender áreas onde há riscos para seus funcionários, conforme previsto na portaria n° 567 de 2009 do Ministério das Comunicações, havendo reclamação formal o Procon Estadual pode determinar aos Correios o atendimento do consumidor sob pena de multa. O consumidor pode e deve registrar reclamações quanto a isto no Procon Estadual. A atitude da autarquia vai depender da quantidade de reclamações. Havendo número significativo delas, o Procon poderá entrar na Justiça com uma Ação Civil Pública ou instaurar um ato administrativo contra a empresa, com decisão cautelar”.
Todos os consumidores ouvidos pelo EXTRA informaram que não foram avisados, antes de contratarem o serviço, de que a encomenda não seria entregue em suas casas. Em nota, no entanto, o Correios afirmou que “O remetente é informado da restrição de entrega no ato da postagem da encomenda”.