Municípios assumem gastos de União e Estados

Valor
18 de fevereiro de 2013

BRASÍLIA – Os municípios brasileiros gastaram mais de R$ 19 bilhões em 2011 para oferecer serviços à população que, por lei, deveriam ser custeados pela União e pelos Estados, segundo estudo feito pelo economista e geógrafo François Bremaeker, da Associação Transparência Municipal (ATM). Serviços como a manutenção do posto dos correios e telégrafo, da unidade municipal de cadastramento dos imóveis rurais e da junta de alistamento militar, embora não sejam de competência dos municípios, terminam sendo custeados pelas prefeituras para que eles estejam disponíveis aos seus cidadãos.

O estudo feito por Bremaeker mostra que os maiores prejudicados são os menores municípios, com população de até 10 mil habitantes, que gastam proporcionalmente mais para garantir os serviços que não são executados pelos Estados e pela União. “A participação relativa desses gastos sobre a receita total é maior nas regiões mais “abandonadas”, ou seja, onde há necessidade de uma atuação mais intensa por parte dos municípios para garantir fornecimento dos serviços à população”, diz o texto da ATM.

Os municípios brasileiros gastam, em média, 5,25% de sua receita orçamentária com a execução desses serviços, de acordo com o trabalho de Bremaeker. A região Sudeste é a única que apresenta um gasto médio municipal abaixo da média nacional. A razão disso, segundo o texto, é o fato dela ser a região que apresenta as mais elevadas receitas orçamentárias médias do país. Entre as regiões, o Centro-Oeste é o que apresenta os resultados mais preocupantes, diz o estudo, pois os seus municípios registram a mais elevada participação relativa de gastos com serviços de responsabilidade exclusiva da União e dos Estados (5,96% da receita orçamentária, em média).

Para realizar o estudo, Bremaeker enviou questionários a todos os municípios brasileiros, com perguntas relacionadas às despesas com serviços de responsabilidade da União e dos Estados e que são custeadas pelas prefeituras. Com base nas respostas, o economista estabeleceu médias desses gastos, de acordo com o tamanho da população dos municípios. Ele utilizou também os dados contábeis municipais que estão disponíveis na página do Tesouro Nacional na internet para projetar a participação dessas despesas nas receitas orçamentárias.

Bremaeker constatou também que 3.895 municípios, com população inferior a 20 mil habitantes, despendem com os serviços e ações da competência dos Estados e da União mais do que conseguem arrecadar com os seus tributos. O texto diz que os 122 municípios com população de até 2 mil habitantes têm um gasto com essas despesas 4,23 vezes maior que o da sua arrecadação tributária.

Para os 1.171 municípios com população entre 2 mil e 5 mil habitantes essa relação é de 3,04 vezes; de 1,99 vezes para os 1.207 municípios com população de 5 mil a 10 mil habitantes e de 1,4 vezes para os 1.395 municípios com população de 10 mil a 20 mil. “Isso representa dizer que 70,02% dos municípios brasileiros comprometem mais do que toda a sua arrecadação tributária para custear serviços que a União e os Estados deveriam executar no seu território por sua própria conta”, diz o estudo.

Em entrevista ao Valor, Bremaeker explicou que ceder pessoal e instalações para o funcionamento de órgãos estaduais e federais é a despesa mais comum das prefeituras. “Geralmente o posto dos correios e telégrafo funciona dentro do prédio da prefeitura, com servidores municipais”, disse. “Quando esse serviço está fora da prefeitura, funciona em um prédio municipal ou alugado pela prefeitura”. A junta de alistamento militar costuma funcionar dentro da prefeitura ou em prédio municipal, também com servidores municipais nas funções, informou. Embora o cadastramento de imóveis rurais seja uma atribuição do INCRA e da Receita Federal, todo o suporte e a orientação da população são feitos por servidores municipais, disse.

Na área de segurança, a situação não é diferente. “A delegacia de polícia funciona com alguns servidores municipais cedidos e a prefeitura é quem custeia a gasolina dos veículos, quando não compra o próprio veículo e custeia a refeição dos presos”, informou. “O mesmo acontece quando há um destacamento da polícia militar no município”. Segundo ele, as guardas municipais passaram a substituir a polícia militar na segurança das vias públicas e até mesmo na organização do trânsito, quando a sua competência é apenas de proteger os prédios públicos, como a câmara, os postos de saúde e as escolas.

O programa federal de saúde da família, por exemplo, financia apenas uma parte dos custos de manutenção da equipe, segundo Bremaeker. “O município tem de entrar com uma contrapartida elevada no custeio dos salários desses profissionais e também dando suporte para o funcionamento da equipe, como o veículo para os deslocamentos”. A prefeitura também acaba custeando o transporte escolar dos alunos de estabelecimentos de ensino estaduais.

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