O mistério dos 2.500 imóveis dos Correios que serão vendidos junto com a estatal
Novo dono dos Correios levará junto 2.500 imóveis em alguns dos bairros mais caros do país – e a estatal nem sabe quanto valem
Com informações do portal The Intercept e pelo Instituto República
17/08/2021
Jair Bolsonaro ganhou aval da Câmara dos Deputados para vender os Correios num leilão previsto para o primeiro trimestre do ano que vem. Quem comprar a empresa levará junto com a operação de distribuição e entrega de correspondências e mercadorias um tesouro pouco conhecido: 2.500 imóveis próprios espalhados por todos os 27 estados do país, incluindo áreas muito valorizadas no mercado imobiliário.
A carteira imobiliária dos Correios é variada: tem prédios empresariais, históricos, imensos galpões logísticos, terrenos e agências em torno das quais cidades cresceram no interior do Brasil. A empresa, vale lembrar, é uma das mais antigas do país – surgiu em 1663, com a criação do cargo de Correiomor das cartas do mar.
Estão na lista o edifício sede da estatal, em Brasília, que sozinho vale mais de R$ 360 milhões, de acordo com o contrato de seguro em vigor até junho passado. Ou um prédio localizado na Pituba, um bairro caro de Salvador, que foi avaliado em mais de R$ 75 milhões ao ser segurado, em 2016, mas foi posto à venda por R$ 248 milhões em 2019.
Além deles, os Correios possuem prédios históricos que são ícones de diversas cidades do Brasil, como os da Rua Visconde de Itaboraí, no Rio, do Vale do Anhangabaú, em São Paulo, e da Praça da Alfândega, em Porto Alegre, os três transformados em centros culturais.
Mais incrível que o patrimônio acumulado ao longo de 358 anos de vida é o fato da estatal não saber exatamente – ou não querer dizer – qual o valor desse acervo que, sozinho, pode render lucros fabulosos a quem comprar a estatal. Isso significa que, na prática, o governo ganhou a primeira autorização para vender uma empresa cujo valor atualizado sequer conhece – ou, se conhece, não informa à sociedade.
Em 2019, os Correios deveriam ter avaliado todo seu patrimônio imobiliário para atualizá-lo no balanço patrimonial que é divulgado periodicamente. A estatal diz ter adotado, em 2014, a prática de levantar os valores reais de seus imóveis a cada cinco anos. Portanto, o levantamento já deveria ter sido refeito. Até o final de 2020, porém, não havia sido concluído.
Em 2013, antes de os Correios reavaliarem sua carteira imobiliária, o balanço da empresa apontava um patrimônio de R$ 1,556 bilhão em imóveis. Após a avaliação, o valor subiu para R$ 5,692 bilhões em 2014. Um espantoso crescimento de 265%, obviamente devido ao meticuloso trabalho de checagem da real situação dos milhares de imóveis da empresa, um a um.
O trabalho jamais foi repetido. Sem dispor da nova avaliação, o balanço patrimonial vem indicando quedas sucessivas no valor da carteira imobiliária, atribuída à depreciação estimada dos imóveis. Assim, em 2019, os Correios estimaram que seus imóveis valiam R$ 5,237 bilhões.
Acontece que, em 2020, a estimativa caiu para R$ 3,850 bilhões. Trata-se de um valor 26% menor que o apresentado em 2019, e nada desprezíveis 32% inferior ao de 2015. Igualmente espantoso é perceber que a estimativa depreciada foi preparada para as demonstrações de resultados apresentadas em maio de 2021, meses depois do governo oficializar o projeto de privatização da estatal.
A conta de padeiro esconde uma impossibilidade prática. É impossível que todos os 2.500 imóveis sofram a mesma depreciação. É improvável que todos eles tenham na prática perdido valor de mercado. Prédios, mesmo antigos, podem subir de preço meramente pela valorização de imóveis vizinhos ou da região da cidade em que estejam, como sabe qualquer brasileiro que vive no meio urbano.
“Depreciação num imóvel não existe. Não há desvalorização no longo prazo”, afirmou o presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis do Distrito Federal, Geraldo Nascimento, que acompanha de perto mudanças no valor de prédios e residências em Brasília e no país, em geral. “Há casos de imóveis que valorizaram 100% de 2014 para cá”.
Nascimento me disse que empresas que querem saber exatamente quanto vale sua carteira imobiliária costumam reavaliá-las a cada 90 dias. “Te falo com toda certeza, sem medo de errar, que uma avaliação de 2014 está completamente defasada”, afirmou, sobre o caso dos Correios.
O puxão de orelhas dos auditores
Os Correios informaram no seu balanço de 2020 que a pandemia atrapalhou a conclusão da reavaliação de sua carteira imobiliária. Acrescentam, ainda, que mudaram a forma de calcular o valor de seus imóveis. Segundo a empresa me informou em resposta a pedido protocolado conforme a Lei de Acesso à Informação, a alteração ocorreu em dezembro de 2020, ou seja, meses antes de o governo formalizar a intenção de vender a estatal.
“Importa esclarecer que em virtude do cenário estabelecido pela pandemia, desde março de 2020, a avaliação da totalidade da carteira imobiliária restou prejudicada, principalmente, em relação aos imóveis situados na região Norte [do Brasil], o que impossibilitou na entrega de 41 laudos que seriam utilizados na mensuração do valor justo”, registraram os Correios, em mau português, nas notas explicativas do balanço patrimonial publicado em 27 de maio.
É também curioso que, na demonstração de resultados de 2019, a estatal tenha informado que o serviço de avaliação dos imóveis já havia sido contratado, mas não concluído a tempo de ser considerado no balanço. Ou seja, ao menos parte do serviço já havia começado muitos meses antes da pandemia.
Auditores da empresa BDO, contratados pelos Correios para avaliar a demonstração dos resultados de 2019, notaram a falta da avaliação de carteira imobiliária na papelada entregue pela estatal. Chamada a opinar sobre a prestação de contas, os auditores disseram que os documentos produzidos pela companhia estavam adequados, mas com ressalvas.
Segundo dois profissionais que trabalham com auditoria de balanços com quem eu conversei, mas que pediram para não terem seus nomes revelados por não terem trabalhado diretamente na avaliação da demonstração de resultados dos Correios, a aprovação com ressalvas de um documento contábil é uma rara exceção. Não quer dizer, a princípio, que a empresa tenha cometido alguma fraude na apresentação de suas contas. Mas só acontece quando uma demonstração de resultado contém informações de credibilidade difícil de comprovar.
No caso específico dos Correios, a falta de avaliação da carteira imobiliária era um dos motivos das ressalvas. A BDO reforçou que a estatal deveria ter reavaliado todos os imóveis em 2019. Como isso não fora feito, ficou impossível constatar se o patrimônio da empresa estava corretamente calculado e divulgado.
Já em 2020, quem analisou o balanço dos Correios foi a Crowe Consult. Desta vez, foi aprovado sem ressalvas. A Crowe, contudo, lembrou em seu relatório as ressalvas apontadas pelo BDO – e que elas tinham relação com a falta de avaliação da carteira imobiliária.
Bairros nobres, áreas valorizadas
Só no Distrito Federal os Correios têm oito imóveis próprios. Seis deles ficam no Plano Piloto de Brasília, a área da cidade projetada pelo urbanista Lúcio Costa, tombada como patrimônio da humanidade pela Unesco em 1987. Ali, o valor de um metro quadrado de apartamento chega a custar mais de R$ 10 mil – o que faz os imóveis rotineiramente custarem perto de R$ 1 milhão.
No Setor Comercial Sul, o principal da cidade, a estatal tem o Edifício Apolo, com sete andares, onde hoje funciona o Museu dos Correios. Em 2017, ele foi avaliado em R$ 6,9 milhões para a contratação de um seguro. No mesmo ano, a Universidade dos Correios, um campus corporativo da estatal que fica bem ao lado da Universidade de Brasília e próxima do lago Paranoá, foi avaliada em mais de R$ 24 milhões – também por uma seguradora.
Em São Paulo, os Correios têm três prédios próprios na Vila Leopoldina, bairro que passa por uma intervenção urbanística promovida pela prefeitura que elevou o metro quadrado dos imóveis a até R$ 10 mil. Os prédios abrigam a sede regional da empresa e um complexo logístico. Um tem 28 andares; o outro, 155 mil metros quadrados de área construída – o equivalente à área de cem campos de futebol.
No Rio de Janeiro, a estatal é dona do imóvel em que fica sua agência na rua Visconde de Pirajá, uma das principais de Ipanema, bairro com um dos metros quadrados mais caros do país. Lá, um apartamento de 100 metros quadrados custa, em média, R$ 1,8 milhão. Segundo os Correios, a agência ocupa 20 boxes numa galeria comercial no coração da Zona Sul carioca.
Os Correios ainda são donos de um prédio histórico em Belém, de quatro andares, localizado na Avenida Presidente Vargas, a principal da cidade. Também possuem um novo e imponente complexo que conjuga um edifício comercial a um centro logístico no Rebouças, bairro da área central de Curitiba.
Em 2010, a Igreja Universal do Reino de Deus pagou R$ 32 milhões pelo terreno de uma antiga fábrica ali ao lado para erguer nele um templo de 35 metros de altura, capacidade para 5 mil pessoas, estacionamento para 650 veículos, heliponto e estúdios de rádio e televisão.
Eu questionei os Correios sobre o valor de sua carteira imobiliária. Primeiro, via Lei de Acesso à Informação, a LAI. Solicitei à estatal a lista completa de seus imóveis próprios e o valor de avaliação de cada um deles. Recebi dados cadastrais dos bens, mas não o preço deles, uma “informação estratégica”, segundo a empresa.
“A divulgação de informações sobre o valor que compõe cada imóvel, poderá suscitar prejuízos à competitividade na eventualidade de uma alienação”, justificou a empresa, em resposta a um recurso que apresentei após a primeira negativa de informações. Em português claro, quer dizer que publicar a informação poderia derrubar o preço dos imóveis em caso de venda. Só que escondê-la permite que a sociedade suspeite que o patrimônio de mais de três séculos poderá ser entregue por menos do que vale
Em outro protocolo via LAI, pedi dados das empresas contratadas para avaliar imóveis dos Correios e quando isso foi feito. Fui informado que as empresas PR1 Engenharia e T. Cichelero Engenharia foram contratadas em 2019 para prestar o serviço seguindo métodos de avaliação descritos em normas da ABNT. Os Correios, porém, não informaram quanto gastou com os serviços.
Eu ainda busquei a assessoria de imprensa da estatal para questionar o assunto e pedir explicações, inclusive, sobre a queda expressiva no valor do patrimônio imobiliário da empresa de 2019 para 2020. Questionei, inclusive, sobre o impacto no eventual valor de venda da estatal à iniciativa privada.
Os Correios só informaram que questionamentos sobre os projetos para sua privatização devem ser encaminhados à Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos do Ministério da Economia. A Secretaria não respondeu a questionamentos enviados por e-mail.
O ministro das Comunicações, Fábio Faria, já declarou que espera vender os Correios por até R$ 15 bilhões. Eu perguntei ao ministério o que baseia essa previsão. Não recebi resposta.
O que vem a seguir
Após a aprovação pela Câmara dos Deputados, o projeto de privatização dos Correios será analisado pelo Senado. Se aprovado sem mudanças, segue direto para sanção de Bolsonaro.
Enquanto a tramitação do projeto segue em debate, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, já estuda como a privatização deve ser realizada. Segundo o banco, ainda não há estimativa oficial sobre o valor de venda da estatal.
A análise sobre a real situação da empresa está prevista para ser concluída ainda neste mês, segundo o BNDES.
No Judiciário, a Associação dos Profissionais dos Correios, Adcap, tenta barrar a privatização alegando que ela é inconstitucional. A Procuradoria-geral da República, a PGR, já se manifestou contra a venda integral da empresa, conforme previsto no projeto em tramitação no Congresso Nacional.
Para além das questões legais, a Adcap argumenta que a venda dos Correios pode comprometer o acesso à população de áreas mais remotas ao serviço postal, seja pelo eventual fechamento de agências ou pelo aumento de tarifas.
A esse respeito, o vice-presidente Hamilton Mourão sinalizou, após a vitória na Câmara, que o governo poderá criar uma nova estatal para cumprir o papel dos Correios no interior do Brasil, onde o acesso é mais difícil e a demanda, menor – ou seja, onde o negócio é menos rentável.
“Entendemos que o governo pode perfeitamente abrir essa atividade para as empresas privadas. Existe um vasto interior do Brasil que deverá continuar a ser entendido por uma empresa ligada ao governo”, afirmou Mourão, segundo o portal Metrópoles.
Enquanto isso, o governo Bolsonaro colocou no ar um site sobre o projeto de privatização. Ali, promete que o comprador dos Correios deverá garantir a universalidade dos serviços postais e que funcionários terão empregos protegidos.
Faltou combinar com o vice-presidente. Com informações do portal The Intercept e pelo Instituto República.
Privatização dos Correios avança a contragosto de sindicatos
Governo federal consegue levar adiante projeto de venda da estatal à medida que serviço dá sinais de piora no Estado. Dirigentes sindicais relacional fato à defasagem de pessoal
Jornal ABC
14.08.2021
Depois de esperar um mês por uma correspondência enviada pelos Correios de Lajeado, cidade a 110 quilômetros de Novo Hamburgo, onde mora, Helena Bisol foi atrás para descobrir o porquê da demora. Ao ligar para os Correios, conta que a informação repassada foi que o atraso decorria da falta de pessoal, por isso, não estavam sendo entregues cartas simples. O documento só chegou depois de dois meses. “O que me deixa indignada é que se cobra pelo serviço, mas ninguém diz na hora do pagamento que não estava sendo realizado”, reclama Helena.
Histórias como a da moradora do bairro Rio Branco, em Novo Hamburgo, são cada vez mais comuns. Num grupo de Facebook, as reclamações aos Correios pipocaram depois que Helena puxou o assunto. Tem gente que reclama que há cinco meses não recebe correspondência.
Outros relatam que os atrasos acontecem há um ano. “Aqui em casa entregaram um pacotão de boletos, todos atrasados”, completa outro insatisfeito.
Neste contexto, manifestações a favor da privatização dos Correios, meta estabelecida pelo governo federal, têm sido mais comuns. O que era inimaginável até alguns anos atrás, quando a empresa rivalizava com os Bombeiros como as instituições mais confiáveis do País. “Eu achei que esta ‘eficiente’ estatal estivesse com ‘Alzheimer’! Do meu bairro esqueceram há tempos. Privatiza já”, defendeu outra usuária insatisfeita com o serviço.
Para entidades que representam trabalhadores dos Correios, os problemas nas entregas se devem à defasagem de pessoal, o que, na visão delas, tem sido proposital para impulsionar o processo de privatização da empresa. Em mais uma vitória para a agenda de privatizações do governo Bolsonaro, o projeto da venda da estatal passou na Câmara dos Deputados no último dia 6. O assunto, agora, está sob análise do Senado. Se o Congresso der aval, o governo planeja fazer o leilão da estatal no primeiro semestre de 2022, quando será vendida 100% para um único comprador.
Secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Correios e Telégrafos do Rio Grande do Sul (Sintec-RS), Alexandre dos Santos Nunes estima que a estatal perdeu mais de 20 mil trabalhadores em menos de dez anos. Atualmente, a empresa conta com mais de 90 mil funcionários País afora, mas eram 120 mil em 2013. “Não temos concurso público desde 2011.
Em fevereiro saíram quase 12 mil a nível nacional, incentivados pelos sucessivos planos de demissão voluntária”, afirma.
Soma-se a este cenário a pandemia, que atingiu a mão de obra que se encontra nos grupos de riscos. Nunes cita ainda que o Rio Grande do Sul sofreu com problemas com empresa terceirizada, que deixou de prestar serviço por um impedimento legal, que só foi resolvido recentemente. “Quem está reclamando é o senhor que não recebe as faturas porque realmente este serviço parou, em detrimento do Sedex e dos outros serviços”, lamenta.
”Duas coisas não podem faltar: pessoal e transporte”
Vice-presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), Marcos César Alves Silva destaca que duas valias não podem faltar nos Correios. “Um dirigente dos Correios percebe rapidamente que há apenas duas coisas que não podem faltar, senão a empresa trava: pessoal operacional e transporte.”
Para ele, a inexistência de concursos públicos e a implantação de programas de demissão incentivada (PDIs) são sinais claros de que a eficiência da estatal não é a preocupação do governo, mas sim sua venda. “Um dirigente que descuida do pessoal ou transporte está intencionalmente prejudicando a organização. No cenário atual, isso ajuda o governo, que faz questão de ficar o tempo todo criticando os Correios, inclusive sobre a qualidade do serviço, para tentar justificar para a população a intenção de privatização.”
Silva avalia que esta defasagem vai criando situações insustentáveis em alguns locais do País. “Como ocorre no Rio Grande do Sul, que junto com o Rio de Janeiro tem enfrentado muitos problemas, pelo que tem nos informado o pessoal local.”
Correios prometem melhora no serviço
Em nota, Os Correios lamentam os transtornos e admitem que, em razão dos protocolos adotados em prol da segurança de empregados, fornecedores e clientes, ocorreram alterações nos serviços prestados. “As entregas em todo o Estado estão ocorrendo, porém a capacidade de distribuição está temporariamente reduzida”, argumenta a estatal.
No intuito de minimizar os impactos aos clientes e otimizar o atendimento e as operações de distribuição, os Correios informam que estão adotando diversas medidas, tais como o remanejamento de empregados de outras unidades, realização de horas extras e a contratação de mão de obra terceirizada — que ingressou nas unidades operacionais na última semana.
“Com essas ações, será possível observar melhora dos serviços de distribuição no Estado nos próximos dias”, assegura a empresa.
Estatal dá lucros, mas exige investimentos
Em 2020, os Correios deram lucro de R$ 1,5 bilhão. Neste ano, o próprio presidente Jair Bolsonaro estimou que a empresa deverá dobrar o lucro. Apesar disso, o governo federal argumenta que não tem como fazer investimentos na empresa para torná-la competitiva.
Recentemente, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, Gustavo Montezano, responsável pelos estudos para a privatização, afirmou esperar maior eficiência na logística interna. Segundo o executivo, o comércio eletrônico poderá sair ganhando, especialmente as pequenas empresas, já que os gigantes do setor têm investido em sistemas próprios de entrega.
De acordo com o projeto aprovado na Câmara dos Deputados, a Associação Nacional de Telecomunicações será responsável pela regulamentação. O texto prevê manutenção da garantia de estabilidade dos funcionários por 18 meses após a privatização e veta o fechamento de agências em pequenas cidades e locais remotos.
Sindicatos questionam intenção do governo
Dirigentes sindicais não acreditam nas boas intenções vindas do governo. O representante da Adcap argumenta que apenas oito países no mundo possuem serviço postal totalmente privatizado e a área somada deles é inferior a do Estado do Mato Grosso. “Nenhum dos 20 maiores países em extensão territorial tem Correios privatizados”, destaca Silva.
O vice-presidente da Adcap frisa que a estatal conta com imunidade tributária, o que acabaria com a privatização. “As tarifas vão subir, é inevitável.” Para a Adcap, o comércio eletrônico, especialmente o pequeno empresário, que usa os Correios pela capilaridade e preços dos serviços, vai ser fortemente afetado.
Na tentativa de impedir a privatização, Ação Direta de Inconstitucionalidade tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). As entidades tentam ainda sensibilizar os senadores para impedir o avanço da ideia.
Correios: privatização pode elevar tarifas de serviços em cidades menores, dizem especialistas
16/08/2021
Assessoria de Imprensa Instituto Presbiteriano Mackenzie
Funcionários também devem ser afetados com reorganização da empresa
Após anos de discussões no setor político sobre o futuro da estatal, o Projeto de Lei 591/21, que prevê a privatização da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), foi aprovado pela Câmara dos Deputados no último dia 5 de agosto. Agora, o projeto de lei segue para votação no Senado Federal.
Segundo o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, os Correios apresentaram um prejuízo de R$ 3,94 bilhões entre os anos de 2013 e 2016 – o que faz a empresa não ser mais tão rentável. As expectativas da possível privatização podem ser positivas e negativas, segundo especialistas.
Para Leila Pellegrino, professora de economia do Centro de Ciências e Tecnologia (CCT) na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) Campinas, os principais afetados negativamente pela mudança serão os funcionários dos Correios e as atividades comerciais que usam o serviço para fazer a ponte entre a mercadoria e o cliente.
“Agora, neste tempo de pandemia, os Correios têm um papel importante de possibilitar o ecommerce. Uma possível privatização pode impactar todos esses agentes envolvidos que correspondem a uma parcela importante da atividade econômica nacional.”, ressalta a economista.
Já o professor de logística Mauro Schluter, também do Centro de Ciências e Tecnologia (CCT) na Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) Campinas, compartilha da análise de Pellegrino e diz que os funcionários dos Correios serão alguns dos afetados, pois, se anteriormente tinham estabilidade financeira, agora não terão mais.
De acordo com Schluter, as cidades pequenas também serão impactadas com a possível alta das tarifas do serviço.
“Como os Correios se tratam de uma estatal, o próprio governo estabelece uma tarifa bastante atrativa para envio de correspondência até para lugares onde não tem uma demanda de bens. Entretanto, a atividade econômica acaba sendo prejudicada em locais como Amazônia, cerrado, caatinga, cuja densidade demográfica não propicia uma atividade econômica viável para geração de bens”.
Schluter explica que, neste caso, pode haver então um encarecimento de serviços, mas faz um contraponto: “por outro lado, a eficiência da nova empresa que irá assumir os Correios pode gerar uma diminuição das tarifas nos eixos de maior população, ou seja, nas capitais onde a atividade econômica é superativa”.
Pellegrino também acredita que, uma vez que a empresa compradora da estatal terá liberdade para praticar o seu preço, esse fator poderá impactar na sua formação de taxas.
A economista diz acreditar que a privatização trará pouco benefício, tanto para o poder público, que irá receber o valor da empresa, quanto para a população no geral, por ser impactada negativamente caso a mudança não venha acompanhada de um controle das tarifas.
“É o mais provável de se acontecer. Isso pode prejudicar a atividade produtiva e a população, então teremos impactos negativos indiretos sobre a atividade econômica e sobre os resultados do governo”, afirma a professora.
Já Schluter analisa que as mudanças no âmbito político dependerão do que está previsto no projeto de lei. “Acredito que não terá impactos. Não é como no caso da Eletrobrás que botaram uma grande rede de energia elétrica no centro do país”.
O professor observa mais benefícios para a população com a privatização. “Os Correios se tornaram bastante ineficazes nos últimos tempos em função da excessiva interferência política nos correios. Não vamos nos esquecer do mensalão, quando começou uma descoberta de corrupção nos Correios”.
Sobre o futuro da estatal, Schluter cita ainda algumas possibilidades como a união de empresas para fazer a administração dos correios, a aquisição pela AliExpress ou uma ideia mais utópica como a internacionalização da empresa.
“A DHL, um grande operador logístico mundial pertence ao Correios alemães, ou um brasileiro que também poderia ser uma empresa logística de âmbito internacional, mas nós sabemos que a política não busca eficiência e sim apadrinhamento de pessoas e recursos”, comenta. Com informações de Assessoria de Imprensa Instituto Presbiteriano Mackenzie.
Direção Nacional da ADCAP.