Ingerência política afunda o Postalis

 

 

Abaixo texto parcial da Matéria do Correio Braziliense, que saiu também no Diário de Pernambuco:

 

Ingerência política afunda o Postalis

 

Fundo de pensão dos Correios soma deficit de R$ 5,6 bilhões e deverá ser coberto pelos participantes nos próximos 15 anos

 

Correio Braziliense
11/05/2015 

A combinação de ingerência política, investimentos desastrosos e regulação frágil forma a receita perfeita para a destruição de um fundo de pensão. Todos esses ingredientes fazem parte da história recente do Postalis, que soma deficit de R$ 5,6 bilhões. Esse rombo deverá ser coberto por contribuições adicionais dos participantes pelos próximos 15 anos. Nem os 35 autos de infração lavrados por auditores fiscais, após fiscalização na gestão dos planos de benefícios da entidade, foram suficientes para que a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) decretasse a intervenção na fundação, que administra o patrimônio dos empregados dos Correios. Especialistas em direito previdenciário avaliam que, nos dois últimos relatórios produzidos por servidores do órgão regulador — que levaram a aplicação de 23 autos de infração —, existem elementos jurídicos que justificariam o afastamento da atual diretoria e a nomeação de um interventor.

 

Os problemas no Postalis começaram durante a gestão de Alexej Predtechensky, que comandou o fundo de pensão entre 2006 e 2012, indicado pelo PMDB. Todos os diretores da fundação são indicados pelo governo, e os participantes têm assentos apenas nos conselhos de administração e fiscal. Enquanto ele era presidente, a entidade fechada de previdência complementar delegou parte da administração dos principais fundos para bancos de investimento, que fizeram aplicações em títulos da Argentina, da Venezuela e em papéis privados lastreados em créditos e garantias podres. Nesse período, foram constatados falta de controles internos para provisionamento de perdas e indícios de conflitos de interesses na composição do comitê de investimentos, na contratação de auditoria independente, de agente fiduciário e de administrador dos recursos.

 

Conforme relatórios da Previc, diversos investimentos do fundo de pensão foram feitos sem as devidas avaliações de risco, o que expôs o patrimônio dos participantes a perdas exorbitantes. Outro problema identificado pelo regulador foi que o diretor financeiro possuía o poder de efetivar aplicações que correspondiam a até 2% dos ativos. No caso do plano de benefício definido, o valor atingia R$ 100 milhões.

 

Um ano após ser nomeado presidente dos Correios, Wagner Pinheiro decidiu substituir Predtechensky por Antonio Carlos Conquista, que foi seu chefe de gabinete enquanto presidia a Petros, fundo de pensão dos empregados da Petrobas. Antes de tomar posse no Postalis, no entanto, Conquista havia ocupado a presidência da Geap — plano de saúde e de previdência dos servidores públicos —, de 2009 a 2010. Naquele período, foi punido pela Previc com multa de suspensão por irregularidades. Ele recorreu da decisão e o processo administrativo aguarda julgamento na Câmara de Recursos da Previdência Complementar (CRPC).

 

Intervenção

 

A chegada de Conquista ao Postalis não trouxe melhorias na gestão dos planos de benefícios. Dos 23 autos de infração lavrados a partir dos dois últimos relatórios de fiscalização, oito têm ligação com operações irregulares realizadas depois que ele assumiu a presidência da entidade. E dos oito, em três operações irregulares, Conquista tinha ciência dos investimentos porque era o administrador estatutário tecnicamente qualificado (AETQ). Entre as operações questionadas estão a aquisição de títulos do banco BVA e a compra de cédulas de crédito imobiliário da Compact Indústria e Comércio de Móveis e da Quinze de Maio Incorporação Imobiliária.

 

O Postalis ainda alega que, dos oito autos de infração, cinco dizem respeito a investimentos que faziam parte da carteira terceirizada, dentro de dois fundos administrados pelo BNY Mellon. Os dois amargam sucessivos prejuízos desde 2011, mas só em 2014 foram transferidos para a gestão da própria entidade. Para Theodoro Vicente Agostinho, mestre em direito previdenciário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), a situação atuarial desequilibrada do Postalis, o descumprimento de disposições estatutárias e de obrigações previstas nos regulamentos dos planos de benefícios, além da aplicação dos recursos das reservas técnicas de forma inadequada, dão base legal para uma intervenção.

 

Dois advogados de fundos de pensão ouvidos pela reportagem na condição de anonimato fizeram a mesma avaliação. A advogada especialista em direito previdenciário Gisele Lemos Kravchychyn detalha que qualquer interferência política que postergue uma intervenção na entidade prejudica os participantes. “Tudo isso é ruim para o sistema, que tem solvência, mas acaba vítima de desconfiança. A maioria das entidades têm boa gestão, mas misturar política e administração de fundos de pensão é ruim”, argumenta.

 

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