O Globo
25/10/2013
A Polícia Federal (PF) indiciou, nesta quinta-feira, o assessor técnico da direção regional do Correios no Rio, João Maurício Gomes da Silva, de 35 anos, por peculato — quando o funcionário público se apropria ou desvia dinheiro ou qualquer outro bem, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo. O crime tem pena de reclusão de dois a 12 anos. Segundo a Delegacia de Repressão a Crimes Patrimoniais (Delepat), o servidor fraudou o plano de saúde do Correios com uma internação de sua mulher, dependente dele, que custou R$ 53 mil aos cofres públicos.
De acordo com o prontuário de Thaisa Guedes, de 33 anos, ela teria ficado hospitalizada entre 24 de julho e 14 de agosto deste ano. No entanto, no dia 27, quando a documentação afirma que a paciente teve um choque séptico em função de uma pneumonia e estava sedada e respirando com auxílio de ventilação mecânica, a mulher aparece, acompanhada de João Maurício, em fotos postadas numa rede social, numa festa de aniversário, no bar Pit Stop, em Jacarepaguá. A aniversariante confirmou, em depoimento à PF, a presença do casal em sua festa, no dia em que as imagens foram postadas.
Em depoimento, nesta quinta, no Núcleo de Repressão a Crimes Postais, da PF, Thaisa e João Maurício confirmaram a internação e, confrontados com as fotos da festa de aniversário, alegaram que não se lembravam do evento.
O EXTRA procurou João Maurício, mas ele não atendeu os telefonemas. No Hospital Rio Laranjeiras, uma funcionária da recepção informou que apenas a direção poderia responder a reportagem e que, por volta das 18h, não teria mais ninguém na clínica.
A Administração Central do Correios afirmou que a direção da estatal, em Brasília, foi quem encaminhou a denúncia sobre o caso ao Ministério Público Federal, em setembro.
Em agosto, o EXTRA revelou que o esquema de fraudes investigado pela PF havia lesado o Correios, com uma única cirurgia de coluna, em R$ 961.886,56. O valor pago por parafusos, porcas e brocas é 1.375% mais caro que o de mercado.
De carteiro a assessor da direção
João Maurício Gomes da Silva é o segundo homem mais forte na Diretoria Regional do Correios no Rio. Com terceiro grau incompleto, Janjão, como é conhecido, entrou na estatal em 1997, como carteiro. Engrenou na vida sindical e, em 2007, foi secretário nacional da Federação Nacional de Trabalhadores da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Fenect). Petista declarado, Janjão foi nomeado, em 2011, assessor técnico da Diretoria Regional do Rio, por Omar de Assis Moreira, diretor do Correios no estado, que, segundo a PF, foi quem pediu a instauração de inquérito, em junho.
Com a ascensão, o salário de Janjão passou de R$ 1.350 para cerca de R$ 12 mil.
Sem requisitos mínimos
A nomeação ignorou as normas do manual de RH do Correios: os requisitos mínimos para ser assessor técnico são ter quatro anos de empresa e dois anos como chefe de divisão ou gerente de região operacional.
A Administração Central do Correios afirmou que a indicação para cargos de assessoria em Diretoria Regional do Correios é feita pela própria Diretoria Regional, com base no histórico funcional, desempenho e perfil dos empregados.
Em nota, a estatal alegou que, “a regra prevê que, em todos os casos em que os empregados não alcançam a pontuação mínima prevista para ocupar função, passem por análise de perfil, realizada por uma banca multidisciplinar. À época da nomeação em questão (2011), por regra administrativa, todos os processos já com parecer da banca sobre a aprovação ou não do candidato eram submetidos à Administração Central apenas por formalidade”.
Janjão passou por uma entrevista em Brasília, mas teria sido reprovado. Foi numa segunda sabatina que o funcionário ganhou passe livre.
A estatal afirmou ainda que, “a fim de aprimorar os controles, a gestão e a transparência do plano de assistência médica, o Correios estão modernizando o sistema com a implantação de uma caixa de assistência no formato de autogestão, com controle, acompanhamento e gestão regulados pela Agência Nacional de Saúde”.
Em seu depoimento na PF, Janjão afirmou conhecer o médico Carlos Alberto Alonso Filho. De acordo com denúncias, ele se apresentaria em nome do Correios para propor negociatas com médicos, hospitais e fornecedores de próteses.