Malbaratamento e dilapidação até parecem palavrões, mas não são. Na verdade, malbaratamento e dilapidação de bens públicos são ações ou omissões de um gestor público que caracterizam a prática de ato de improbidade administrativa. A previsão está contida no caput do artigo 10, da Lei nº. 8.426/1992:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
Além da previsão no caput, temos alguns incisos do artigo 10, que podem ser destacados como o I, IV, XII,
I – facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;
IV – permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;
XII – permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;
Essas condutas previstas na Lei de Improbidade Administrativa estão em curso pelos membros do Governo Federal responsáveis pelo projeto de privatização dos Correios, como foi demonstrado, claramente, pela última entrevista da secretária especial do PPI, Martha Seillier.
Talvez pela inexperiência na gestão pública, característica principal do atual governo, a atual secretária disse que o Governo não pretende arrecadar com a venda dos Correios para a iniciativa privada, mas sim receber um “valorzinho” (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2021/08/28/martha-seillier-correios-privatizacao-ppi-leilao.htm).
A fala da secretária, além de personificar um total desprezo pela empresa, seu patrimônio, história e importância para o país, demonstra também o total desconhecimento sobre os mecanismos de defesa do patrimônio público, em especial a caracterização de ato de improbidade administrativa.
É bom lembrar que não é só ímprobo quem rouba ou desvia recursos públicos. Também o é aquele que causa prejuízos ao patrimônio público, como é o caso dos Correios, caso o processo de privatização continue.
Pelo que se demonstra até o agora, o projeto conduzido pelo governo federal não está construído sob bases técnicas. O que interessa ao governo é o simples repasse da empresa, por isso uma afirmação estapafúrdia como a feita pela secretária.
A empresa possui vários ativos como imóveis, máquinas e equipamentos de triagens, veículos, computadores, só para citar os principais, que somam cerca de R$ 14 bilhões. A empresa possui uma marca forte e presente no imaginário da população que sequer está valorada. A empresa também tem forte capacidade de gerar lucro, como tem demonstrado nos últimos exercícios sociais (https://correios.com.br/acesso-a-informacao/institucional/publicacoes/demonstracoes-financeiras/2020/demonstracoes-contabeis-2020). Então, repassar a empresa por um valor menor que seus ativos e sua capacidade de gerar lucro, é lesão ao patrimônio público, e isso caracteriza improbidade administrativa.
A simples vontade do governo não pode servir de justificativa para a terceirização. É necessário que se demonstre ao Congresso Nacional, ao Tribunal de Contas da União e à sociedade em geral, as vantagens para o País. E, neste caso, a vantagem também tem de levar em conta o valor de venda da empresa, sob pena da prática de ato de improbidade.
Esse é apenas o aspecto econômico da defesa do patrimônio público, sendo que nem está aqui se falando do apagão postal pela falta de atendimento em mais de 5 mil municípios do país, além da flagrante inconstitucionalidade do projeto, que despreza a obrigação da União de prestar o serviço postal (art. 21 CF). Só para lembrar que regulamentar o serviço não é o mesmo que prestar o serviço. São verbos e ações distintas em qualquer interpretação que se faça, seja linguística, seja jurídica.
A proteção do patrimônio público, caso o projeto avance dessa forma desarrazoada, pode e deverá ser feita pelo Ministério Público Federal, pelos Sindicatos, Federações e Associações de Trabalhadores, em ações coletivas, e também por qualquer cidadão por meio de ação popular.
Direção Nacional da ADCAP.