Sala de aula vazia, bolso cheio na Gama Filho e UniverCidade

Revista Exame
02/08/2013

 

A Gama Filho e a UniverCidade, duas das maiores instituições de ensino do Rio de Janeiro, estão à beira da falência — mas seus antigos donos podem embolsar 150 milhões de reais.

 

São Paulo – Existem três tipos de universidade no Brasil. Há as instituições sem fins lucrativos, as escolas privadas e há o curioso caso do grupo Galileo Educacional. Trata-se de uma empresa privada, mas criada com a união de duas escolas sem fins lucrativos do Rio de Janeiro: a Universidade Gama Filho e a UniverCidade.Para estudantes e funcionários, a união, em 2011, foi um péssimo negócio. As escolas têm mais de 20 000 alunos e uma série de problemas: dívidas de 910 milhões de reais, greves, protestos e até uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

 

Mas, para seus antigos controladores, a criação do Galileo pode render pelo menos 150 milhões de reais. Seria um caso único de fundadores de escolas sem fins lucrativos que ficaram milionários. Como é possível? 

 

A história tem como protagonista o advogado Márcio André Mendes Costa. No fim de 2010, ele criou o Galileo com o objetivo de reestruturar a Universidade Gama Filho. A instituição, fundada em 1939, acumulava dívidas de 260 milhões de reais com fornecedores, funcionários e governo. Costa era advogado de Paulo Gama, herdeiro e presidente da Gama Filho, e sugeriu a seu cliente que transferisse o controle da universidade a uma empresa comandada por ele próprio.

 

Como a Gama Filho não tinha fins lucrativos, a transferência teria, por lei, de ser gratuita. Na sequência, Costa bateu à porta de fundos de pensão em busca de dinheiro para pagar as dívidas e reinvestir na instituição. O Postalis, dos funcionários dos Correios, comprou 75 milhões de reais em debêntures.

 

A Petros, dos funcionários da Petrobras, investiu 25 milhões de reais. A garantia dos papéis eram recebíveis das mensalidades do curso de medicina, que chegavam a 4000 reais. O Postalis diz que as debêntures eram atrativas pelos fundamentos do plano de recuperação e pela alta rentabilidade. A Petros não se pronunciou. Costa também tomou empréstimos bancários de 80 milhões de reais. O plano parecia fazer sentido.

 

Mas, em vez de investir na escola, Costa assumiu outra instituição em apuros, a UniverCidade, fundada pelo ex-banqueiro Ronald Levinsohn. Ele ficou conhecido nos anos 80 pela quebra da financeira Delfin, na época dona da maior caderneta de poupança do país. Com dívidas de 265 milhões de reais, a UniverCidade também foi cedida ao Galileo gratuitamente.

 

O plano já não fazia tanto sentido assim. Mas documentos obtidos por EXAME revelam que, por trás das transferências, existiam contratos de pagamentos milionários aos antigos mantenedores. Paulo Gama e um sobrinho dividiriam quase 45 milhões de reais para não assumir cargos executivos durante cinco anos em outra instituição de ensino.

 

Ainda cobrariam 1,8 milhão de reais por mês pelo aluguel de imóveis e da marca Gama Filho. Com Levinsohn, o Galileo estabeleceu uma indenização de 100 milhões de reais para que duas outras entidades filantrópicas dirigidas por ele — Instituto Cultural de Ipanema e Associação para a Modernização da Educação — permanecessem fora do setor de educação por 30 anos.

 

“Esses contratos de não competição eram subterfúgios para remunerar os antigos controladores e fazer lucro com entidades sem fins lucrativos”, diz um ex-funcionário do Galileo.

Era um negócio fora do comum para o setor de educação, mas era um baita acordo para Levinsohn e para a família Gama. O problema é que o Galileo não gerou o lucro necessário para pagá-los. Com pouca experiência administrativa, Costa piorou os números das escolas com um estilo de gestão esquizofrênico — cortava de um lado, esbanjava de outro.Assim que assumiu, demitiu 1 000 professores e funcionários. Por outro lado, contratou os ministros do Supremo Tribunal Federal José Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, que iam de Brasília ao Rio de jatinho para dar aulas no curso de direito. No de medicina, sua principal fonte de renda, a Gama Filho rompeu em 2012 o contrato com o hospital onde seus alunos faziam aulas práticas.

 

Sem a estrutura necessária, o Ministério da Educação reduziu as vagas do curso de 400 para 170 por vestibular. A escola também foi despejada de unidades na estação de metrô Carioca e no shopping Downtown. Hoje, o prejuízo mensal é de 2 milhões de reais.

 

Costa, Levinsohn e Gama atualmente brigam na Justiça. Levinsohn e Gama admitem os contratos milionários, mas negam ter cobrado pela transferência das universidades. “Transferi para manter a obra”, diz Gama. “Coloquei muito dinheiro na UniverCidade”, afirma Levinsohn. O caso ficou mais nebuloso no fim de 2012.

 

Em outubro, Costa vendeu o controle do Galileo para Adenor Gonçalves dos Santos, que se apresenta como empresário e pastor da Igreja Batista. Procurado por EXAME, Costa diz que voltou a atuar como advogado e que herdou os problemas dos antecessores. O novo dono, Santos, nunca foi visto nas universidades.

 

Não se sabe quanto pagou nem qual seu interesse nas instituições. “Ele nem sequer respondeu aos convites para falar à CPI”, diz o deputado estadual Robson Leite (PT), relator da CPI sobre o caso na Assembleia Legislativa do Rio. O novo presidente do Galileo, Alex Porto, diz que o pastor sempre se interessou por educação e viu no Galileo uma chance de empreender.

 

“Não há risco de quebra”, afirma Porto. Não é o que dizem três fornecedores que, em junho, pediram a falência do Galileo à Justiça. Depois de autorizar a transferência das escolas, o Ministério da Educação impediu a abertura de novas vagas enquanto a decisão não sai.

 

“A dimensão da crise não era visível para nós”, afirma Jorge Messias, secretário de regulação do ministério. No meio da confusão, os estudantes só começaram o ano letivo em abril e não têm ideia se chegarão a terminá-lo.

 

TCU investiga ajuda de órgãos públicos a empresas de Eike

O Globo
2/08/13

BRASÍLIA – O Tribunal de Contas da União (TCU) abriu três processos nos últimos dias de julho para investigar a atuação de órgãos federais e os repasses de recursos públicos às empresas X, do empresário Eike Batista. O pedido de apuração partiu do Ministério Público (MP) junto ao TCU, que apresentou cinco representações a quatro ministros do tribunal para que seja apurada a real participação da União nos negócios de Eike e eventuais prejuízos aos cofres públicos.

O vice-presidente do Tribunal, ministro Aroldo Cedraz, confirmou ao GLOBO que determinou a realização das primeiras diligências, cuja responsabilidade é das áreas técnicas do TCU, quando estava no exercício da presidência do órgão, na semana passada.

São cinco as frentes de investigação, conforme as representações assinadas pelo procurador Júlio Marcelo de Oliveira e encaminhadas aos gabinetes dos ministros, de acordo com as áreas em que atuam. A última foi protocolada na quarta-feira, dia 31.

Transparência em xeque

O primeiro processo, aberto no dia 22, investiga as operações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com empresas do Grupo EBX, controlado por Eike Batista. O procurador Júlio Marcelo critica a falta de transparência do banco com as operações de crédito realizadas. Conforme a representação, diligências devem ser feitas no BNDES com o propósito de descobrir o valor total das operações, quais empresas do grupo EBX teriam sido beneficiadas, que garantias foram dadas, quais as providências para preservar o patrimônio do banco e se existe algum risco à instituição financeira “na hipótese de insolvência do referido grupo”.

Outro foco de investigação é a Agência Nacional de Petróleo (ANP), responsável pelos leilões de petróleo. A OGX venceu leilão na Bacia de Campos (RJ) e apresentou a declaração de comercialidade à ANP, em que atesta a possibilidade de exploração de jazidas no local. Depois, a empresa recuou e declarou não haver tecnologia suficiente para explorar um campo específico, o que derrubou o preço das ações.

O prazo para a apresentação de um plano de desenvolvimento e para análise pela ANP já se esgotou, segundo a representação do MP junto ao TCU. “O decurso de tempo foi fundamental para toda a assimetria de informação gerada no mercado de capitais”, cita o procurador Júlio Marcelo no pedido de investigação. O Tribunal deve apurar eventual responsabilidade da agência na demora para analisar a declaração de comercialidade de poços de petróleo em Campos, além da possibilidade de um “vácuo legal e regulatório” no setor. Se confirmadas as irregularidades, medidas “corretivas e repressivas” devem ser adotadas, como pede o MP.

À Comissão de Valores Mobiliários (CVM) caberá explicar se houve “manipulação do mercado” e “uso indevido de informação privilegiada” na venda de ações da OGX antes de vir a público a informação de que a exploração de alguns poços de petróleo não seria viável.

O processo para “apuração de várias irregularidades” tramita desde o dia 29. O MP também pede que o TCU faça diligências junto à Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), para verificar as circunstâncias da aplicação dos recursos dos Fundos Postalis (Correios) e Previ (Banco do Brasil) em ações do grupo EBX. O MP, junto ao TCU, também quer saber se BB, Caixa Econômica Federal, Banco do Nordeste e Banco da Amazônia financiaram empresas X.

“O Grupo EBX está imerso em uma crise de confiança por parte do mercado financeiro nacional e internacional. (…) Os investimentos que as empresas ainda estão realizando não estão na fase de gerar caixa suficiente para que possam ser concretizados”, argumenta o procurador nos pedidos de investigação.

Procurado pelo GLOBO, o grupo EBX disse que não irá comentar as investigações do TCU. Sobre os contratos com o grupo, o BNDES sustenta que o tratamento “é rigorosamente igual ao dado a qualquer empresa tomadora de crédito no BNDES”. “Todas as operações foram estruturadas com o rigor usual praticado, de acordo com as melhores práticas bancárias.”

Já a ANP afirmou que a atuação da agência ocorre “em total aderência à legislação e aos normativos vigentes”. A CVM, por sua vez, informou não ter sido notificada pelo TCU e que não há informações adicionais a prestar no momento, além do expresso em “nota ao mercado” divulgada em 3 de julho. “Dentro de sua esfera de competência e conforme pode ser verificado em seu site, a CVM vem, na sua rotina de supervisão, apurando fatos envolvendo a OGX e outras companhias do mesmo grupo, incluindo aqueles recentemente divulgados na mídia”, diz a nota. A Previc informou que vai prestar as informações ao TCU no momento oportuno.

 

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