O ESTADO DE S. PAULO
ANDREZA MATAIS E MURILO RODRIGUES ALVES
06 Maio 2015
Relatórios da Superintendência Nacional de Previdência Complementar apontam que dirigentes e conselheiros do fundo de pensão dos Correios não agiram ‘com zelo e ética’ nos investimentos; os documentos foram enviados ao Ministério Público e à PF Após seis meses de investigação, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) chegou à conclusão de que os diretores e conselheiros do Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios, foram responsáveis por parte do rombo de R$ 5,6 bilhões no plano de benefício definido dos participantes do fundo. A constatação está em dois relatórios confidenciais, aos quais o ‘Estado’ teve acesso.
De acordo com os documentos da Previc uma autarquia vinculada ao Ministério da Previdência Social, responsável por fiscalizar as atividades das entidades fechadas de previdência complementar , os gestores “não agiram com zelo e ética”. São acusados de má gestão e de não observar, sobretudo, a rentabilidade dos fundos onde depositaram o dinheiro dos participantes.
Entre os investimentos que levaram o fundo a apresentar esse déficit bilionário estão aplicações em títulos de bancos liquidados, como Cruzeiro do Sul e BVA, e investimentos atrelados à dívida de países com problemas, como Argentina e Venezuela.
Numa reunião tensa na terçafeira da semana passada, com representantes do Postalis e entidades sindicais, o chefe da Previc, Carlos de Paula, afirmou que as irregularidades cometidas pelos gestores da fundação ultrapassam a fronteira administrativa e configuram crime.
“O sistema da Previc está preparado para pegar inaptidão, erros, e não para lidar com atitudes criminosas”, teria afirmado, segundo relatos. Por essa razão, o relatório da Previc, que abrange o período de 2012 a março de 2014, foi enviado ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal. As sindicâncias foram encerradas pela Previc em dezembro, mas somente agora o Postalis foi instado a se manifestar.
Os documentos da superintendência resultaram em 23 autos de infração aos gestores, o primeiro passo antes da punição. Diante do cenário apurado, na maioria dos casos, a Previc diz que “não cabe nem defesa” do Postalis; em outros, há determinações a serem cumpridas ou pedidos de posicionamento acerca de 36 títulos. O rombo é o maior entre os fundos de pensão do País, uma vez que supera o próprio patrimônio do Postalis. E, se não for equacionado, pode deixar 70 mil participantes sem aposentadoria.
Justiça. Na reunião da semana passada, o chefe da Previc ainda teria cobrado da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap) que desistisse da ação na Justiça para que os funcionários não tenham de arcar com parte do rombo. Carlos de Paula teria ponderado que a medida poderia levar à quebra do fundo. “É preferível quebrar do que o trabalhador ter de se sacrificar perdendo parte do salário”, respondeu Luiz Alberto Menezes, presidente da Adcap.
A Previc é vinculada ao Ministério da Previdência, pasta controlada pelo PMDB do Senado durante todo o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. O PT assumiu a gestão no segundo mandato, com Carlos Gabas. A quebra do fundo não interessa ao Postalis nem à Previc, que teria de responder por que deixou a situação chegar a esse ponto. Antes desses dois relatórios de fiscalização, a Previc tinha lavrado, de 2012 até agora, 12 autos de infração envolvendo dirigentes do Postalis por causa de irregularidades nos investimentos.
A maior parte dos dirigentes autuados ainda continua à frente do Postalis. O fundo dos Correios vem sendo controlado há 12 anos pelo PMDB dos senadores José Sarney (AP), Edison Lobão (MA) e Renan Calheiros (AL) e do PT da Câmara. Renan negou, por meio da assessoria, ter feito indicações no Postalis. A reportagem não conseguiu contato com Sarney e Lobão.