UMA AUDIÊNCIA PÚBLICA EXTEMPORÂNEA E UM CONTRATO DE CONCESSÃO QUE PRIMA PELA SIMPLES TRANSFERÊNCIA DE RISCOS PARA A SOCIEDADE

Apesar de entender que consultas públicas são oportunidades de se debater iniciativas do governo, e, como tal positivas, a ADCAP considera importante apontar algumas questões graves relacionadas àquela que o Ministério das Comunicações está promovendo para tratar do Contrato de Concessão do Serviço Postal Universal, conforme anunciado por aquele órgão.

Primeiramente, é importante perceber que a iniciativa chega fora do tempo adequado, pois a legislação sobre o tema sequer foi aprovada no Congresso Nacional, havendo ainda diversos pontos relevantes em discussão, que podem até mesmo significar a interrupção da iniciativa ou, então, mudanças profundas no projeto apresentado pelo governo. Discutir o contrato de concessão sem ter vencido as etapas anteriores de tramitação é, portanto, apenas uma tentativa de ganhar tempo no processo, de forma inadequada, posto que, sem as bases do modelo de privatização estabelecidas e devidamente aprovadas, qualquer discussão é apenas mera elucubração, não podendo ser considerada como realização de etapa formal de um processo de privatização, como tenta o governo.

Não obstante a extemporaneidade da iniciativa, numa análise rápida do Contrato de Concessão do Serviço Postal Universal submetido à Consulta Pública, a ADCAP aponta as seguintes questões:

– No contrato há cláusulas muitíssimo relevantes, como a da fundamentação legal do Contrato, das Penalidades etc., que reportam a uma legislação a ser elaborada e aprovada no futuro, inexistente para o fim de se verificar a principiologia e base normativa que regerá a relação entre as partes contratantes; como contribuir na Consulta Pública se sequer a Política e regulamentação são hoje conhecidas?

– A cláusula 9.2. aparenta repassar para a Concessionária os riscos com eventuais prejuízos; no entanto, as cláusulas de reequilíbrio e de ajuste tarifário desfazem esta premissa, com mecanismos que, a depender da regulamentação e gestão da Anatel, poderão resultar em repasse destes valores negativos ao usuário, onerando ainda mais a população.

– A cláusula 12.3. fala de 24 meses de testes, dando a entender que só depois disso a Anatel terá condições para monitorar a prestação de serviço adequado ao cidadão.

– A partir da leitura das clausulas 13.7.5 e 14.2.3, tem-se que a implantação de novas tecnologias, solicitadas pelo órgão regulador, dará ensejo ao reequilíbrio. Leia-se: o usuário pagará a conta. De igual sorte, na hipótese de novas metas para a Concessionária, haverá causa de reequilíbrio (majoração tarifária ou dinheiro público investido).

– A cláusula 17.1 possui redação que poderá, no futuro, justificar QUASE NUNCA realizar a fiscalização descrita, pois o termo “quando achar conveniente” é vago e impróprio para o modelo.

– Os riscos ao Poder Concedente (União) mencionados na clausula 18.4 não possuem, em contrapartida, qualquer plano contingencial ou descrição de onde virá o recurso para custeio deste.

– As cláusulas 19.1, 20.1 e 20.7 trazem regras de reequilíbrio que possuem operacionalização incerta e redação que pode gerar diversas situações autorizadoras de reajuste de tarifas ou financiamento público.

– A cláusula 22 traz a figura da revisão quinquenal, com um potencial gigantesco de ser utilizado para um novo formato à concessão, com revisões inclusive tarifárias e de escopo.

– A revisão extraordinária prevista na clausula 23 é mais uma forma de instauração de procedimento de reequilíbrio.

– As cláusulas 35 a 42 representam risco de grande impacto ao erário sem que esteja explicado como se daria a mitigação desse risco por parte do Poder Concedente.

Assim, além de extemporânea, a audiência pública coloca em discussão uma peça que transfere para a sociedade uma série de riscos sem apontar como esses riscos seriam mitigados e como se daria o custeio desse processo de mitigação.

Direção Nacional da ADCAP.

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