Valor
17/02/2014
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) se prepara para dar, até o fim de abril, dois passos decisivos em sua tentativa de modernização. Um deles é o fechamento de um acordo para tirar do papel a já anunciada operadora virtual de telefonia celular. O plano de negócios da estatal estabelece a meta de alcançar 8 milhões de clientes em um prazo de cinco anos, abocanhando cerca de 3% do mercado. Outro é um projeto-piloto para espalhar terminais de autoatendimento para a entrega de encomendas – principalmente do comércio eletrônico – em pontos de grande circulação, como estações de metrô e supermercados.
Movimentos importantes na reestruturação da estatal, como os novos contratos para franquias postais e uma parceria de longo prazo com o Banco do Brasil para aumentar a oferta de serviços financeiros, avançaram nos últimos meses e resolveram pendências na parte de trás do balcão. Em 2014, devem surgir novidades com forte apelo comercial.
Nos próximos dias, começa o processo formal de negociações para um acordo de compartilhamento com alguma operadora de telefonia. Serão enviados pedidos de proposta, conhecidos pela sigla em inglês RFP (“request for proposal”), às quatro grandes empresas do setor. Uma parceria pode ser concretizada até abril.
A criação de uma MVNO, como é chamado no jargão do setor esse tipo de operação, tem sido anunciada pelos Correios desde 2011. O presidente da estatal, Wagner Pinheiro, atribui a demora em tirar o projeto do papel à necessidade de um “estudo cuidadoso” e de uma “parceria adequada para a empreitada”. Considera viável, no entanto, a estreia do serviço até o fim do ano. “No último trimestre, esperamos oferecer o produto”, afirmou Pinheiro ao Valor.
Uma nova empresa está sendo criada para esse negócio. Ela terá 51% de participação acionária da Poste Mobile, subsidiária do correio italiano para a telefonia celular, e 49% da ECT. O acordo para a constituição da empresa já foi assinado. A escolha pela parceria com a Poste Mobile, segundo o executivo, se deve à experiência dos italianos com sua operadora virtual de telefonia. Pinheiro diz que ela atua desde 2007, detém 4% do mercado local de celulares e se transformou numa das maiores geradoras de receitas para a Poste Italiane, sua controladora.
As operadoras virtuais de telefonia móvel, que já constituem um modelo bem-sucedido em vários países da Europa, não têm frequência nem infraestrutura de rede própria. Por isso, elas precisam fazer acordos de compartilhamento. Em linhas gerais, compram minutos no atacado das grandes empresas, com descontos proporcionais à dimensão do negócio. Depois, vendem esses mesmos minutos – e um conjunto de outros serviços – no varejo, aproveitando seus pontos de comercialização.
A expectativa dos Correios é investir R$ 150 milhões em cinco anos e, ao fim do período, alcançar receita de R$ 1,5 bilhão com sua operadora móvel. Assim que for fechado o acordo com uma das grandes operadoras, a ECT enviará um pedido de licença de funcionamento à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o que deve ocorrer entre 45 e 60 dias.
As metas da estatal são ambiciosas: conseguir 6 milhões de clientes no terceiro ano de operação e 8 milhões no quinto ano. O objetivo é ter cerca de 3% do mercado, que tem 271 milhões de linhas ativas. Por enquanto, só entraram em operação com suas redes virtuais, a Porto Seguro Conecta, com 101 mil linhas, e a Datora, com 19,6 mil, segundo a Anatel.
Outra iniciativa que ganhará corpo é a instalação, até o fim de abril, de 8 terminais de autoatendimento para a postagem e entrega de encomendas no Rio de Janeiro. Em seis meses, serão 21 quiosques, como parte de um projeto-piloto – também haverá máquinas em São Paulo, Brasília e Belo Horizonte. Os terminais funcionarão 24 horas por dia, em pontos como estações de metrô, shopping centers e supermercados. A tendência é levar a experiência para outras cidades a partir de 2015.
O foco principal do projeto são as entregas de comércio eletrônico. Hoje, 4% das encomendas entregues pela ECT – incluindo o Sedex – acabam sendo devolvidas porque, entre outros motivos, os moradores não estavam em suas casas naquele horário ou os porteiros de edifícios residenciais não estavam autorizados a receber objetos em nome do destinatário. O índice de devolução em países que usam esses quiosques é inferior a 1%. Trata-se de uma alternativa bastante difundida em mercados como EUA, Europa e Chile.
Em vez de colocar seu próprio endereço, o consumidor poderá indicar um dos terminais de autoatendimento dos Correios como local de entrega da encomenda, deixando para sua conveniência o horário de retirada. Para que isso seja possível, no momento da compra em um site de comércio eletrônico, as lojas virtuais terão que oferecer os quiosques da ECT entre as opções de entrega. A estatal está em fase adiantada de discussões com um grupo de cadeias importantes do varejo para deixar essas opções disponíveis.
O objetivo, diz Pinheiro, é oferecer mais comodidade ao cliente. “As pessoas querem facilidade e condições de fazer as coisas por elas mesmas”, avalia. No projeto-piloto, estão sendo investidos R$ 3 milhões em alocação de espaço para os terminais e adaptação de sistemas. Os quiosques foram cedidos, em regime de comodato pela Loginpost (Lituânia), Inpost (Polônia), Keba Neopost (Alemanha) e Buy Box (Reino Unido).
Com essas iniciativas, a ECT reforça sua aposta no mercado concorrencial, tentando escapar da vulnerabilidade imposta pelo segmento postal. A operação virtual, a oferta de produtos financeiros e a ampliação do leque de serviços para a entrega de encomendas expressas são passos decisivos.
O presidente dos Correios pretende concluir neste ano o processo de licitação de 425 novas agências franqueadas. O Tribunal de Contas da União precisa dar aval ao edital definitivo de licitação. Já foi resolvida a situação da maior parte das franquias postais que estavam com contratos antigos. Em 2012, no entanto, 288 unidades que a ECT buscava licitar não despertaram interesse do mercado ou os concorrentes não conseguiram preencher as exigências dos Correios. Na nova licitação, parte dessas unidades será oferecida novamente, com ajustes nas exigências. A concorrência também abrange agências novas. Hoje, existem 1,1 mil franquias em funcionamento, que equivalem a 31% das receitas totais dos Correios.