Guerra postal

Istoé Dinheiro
30/05/2014

 

As grandes operadoras logísticas globais, como a Fedex e a UPS, estão avançando no Brasil em negócios que interessam aos Correios. Conheça as suas estratégias e como a estatal vai se defender do avanço estrangeiro e tentar garantir o seu futuro.

 

Atuando com isenção fiscal, proteção do monopólio em seu negócio principal – a entrega de cartas e telegramas – e com grande capacidade de investimentos – um dos benefícios de ser sustentada pela máquina pública –, a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT) é uma empresa feita para durar. Criados em 1931 com a unificação dos serviços postais brasileiros, mas com origens que remontam à famosa carta de Pero Vaz de Caminha ao rei de Portugal, os Correios são hoje um colosso que fatura R$ 17 bilhões e emprega 125 mil funcionários. Mas nem tudo são as melhores notícias para a organização.

 

A internet fez o negócio de envio de cartas e telegramas tornar-se uma atividade apenas para nostálgicos. Sua principal fonte de receita, a entrega de correspondência comercial – em especial a de concessionárias de telefonia, luz e água –, também vem aos poucos migrando para meios eletrônicos. E, como se não bastasse, poderosos rivais internacionais avançam nos negócios localmente, investindo em operações no Brasil. Empresas globais como Fedex, UPS e DHL demonstram interesse em fazer frente ao gigante brasileiro, nas operações logísticas, de transporte de cargas leves. As rivais já estão diminuindo a distância que as separava do líder.

 

Até o ano passado, a americana Fedex possuía apenas 600 funcionários locais. Com a aquisição, em 2012, da pernambucana Rapidão Cometa, a segunda maior compra de sua história, no mundo, a Fedex passou a ter quase dez mil empregados no País e ganhou musculatura para atuar no mercado de entregas domésticas, dominado pelos Correios e que movimenta R$ 17 bilhões por ano. “O Brasil tem uma excelente demografia e uma economia que está se movendo para o consumo. Com a aquisição, nos tornamos a maior rede privada de transportes do País”, afirmou por telefone Michael Ducker, chefe de operações e presidente de negócios internacionais da Fedex Express.

 

“Certamente, o País está passando por um caminho acidentado, mas todos os indicadores principais mostram que será um mercado de grande crescimento no futuro.” Para captar esse potencial, a empresa pretende finalizar a fase de integração em julho deste ano, desativando a marca Rapidão Cometa, para operar apenas com o nome Fedex. Segundo Ducker, os investimentos continuam. Desde dezembro do ano passado, a Fedex inaugurou um terminal alfandegário em Suape, em Pernambuco, e um terminal logístico em Curitiba. Em outra frente, investiu na compra de veículos para reduzir pela metade a vida útil de sua frota, para 2,8 anos.

 

A também americana United Parcel Service (UPS) dá indicações de que igualmente pretende seguir um caminho de investimentos agressivos. Há dois anos, a UPS fez uma proposta para comprar a TNT, por US$ 6,5 bilhões. “Infelizmente, não conseguimos concluir a aquisição, com a qual teríamos nove mil funcionários aqui”, diz Romaine Seguin, presidente para as Américas da UPS, que possui 3 mil empregados no Brasil. “Podemos adquirir alguma transportadora no País”, afirma Nadir Moreno, presidente da UPS no Brasil. “Nada está descartado.” O principal avanço recente foi a expansão, ocorrida desde 2011, de quatro para oito bases operacionais.

 

Neste ano, deverão ser anunciadas novas unidades, a serem instaladas no interior de São Paulo. Um dos principais interesses no mercado brasileiro está na expansão do comércio eletrônico, mercado que cresce anualmente cerca de 25%. Estima-se que em 2015 o comércio eletrônico movimente R$ 15 bilhões. “A Fedex e a UPS nasceram para ser o correio postal nos EUA. Com o passar dos anos, elas tiveram de evoluir e tornaram-se também operadores logísticos”, diz José Geraldo Vantine, diretor- geral da paulistana Vantine Consultoria, especializada em logística. “Quando chegaram no Brasil, encontraram um monopólio nas entregas postais e ofereceram serviços que os Correios não operavam, como as entregas porta a porta.”

 

No entanto, com o avanço da internet, os Correios demonstram cada vez mais interesse em também competir por esse espaço. Em 2011, a presidenta Dilma Rousseff sancionou uma lei que permitia ampliar o campo de atuação da estatal e até comprar empresas e atuar no Exterior. Além disso, o Supremo Tribunal Federal decidiu, no ano passado, que os Correios podem se beneficiar de sua imunidade tributária nos seus novos negócios, que incluem o transporte de carga expressa e a logística reversa (a busca de produtos em um cliente para levar de volta ao fabricante).

 

Essas resoluções deram a partida a um ciclo de investimentos que, entre 2012 e 2014, vai somar R$ 1,55 bilhão. Os recursos envolverão a construção de mais centros de triagem, a adoção de novas tecnologias, a expansão de agências e de frota. Para simbolizar o momento especial, a empresa anunciou um novo logotipo. “A mudança de marca é uma consequência dessa reformulação dos negócios”, afirmou à DINHEIRO Wagner Pinheiro de Oliveira, presidente dos Correios. Entre os novos projetos da estatal, está a administração de documentos eletrônicos, em conjunto com a empresa de certificação digital da brasileira Valid.

 

“Poderemos, por exemplo, ser contratados para cuidar da leitura da conta de gás do cliente, enviar a cobrança pela internet, com certificação digital, e armazenar o documento eletrônico gerado por vários anos”, disse. Outra parceria foi fechada com o Poste Italiane, o serviço de correio da Itália, para a criação de uma operadora virtual de telefonia móvel. Com esse modelo de negócios, a joint venture criada venderá serviços telefônicos, pagando às operadoras tradicionais, como Oi, Vivo, TIM e Claro, pelo uso de suas redes. Em cinco anos, a expectativa é ter oito milhões de clientes e faturamento de R$ 1,5 bilhão. Se tiver sucesso, os Correios terão menos motivos para se preocupar com o futuro.

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